Ao longo dos anos, as reuniões mensais do Clube do Picadinho – uma confraria que, há décadas, reúne sete amigos de longa data – passaram de rituais de poder a melancólicas assembleias de fracassados e de promessas não-cumpridas. O fim seria o seu único destino digno até à chegada de um talentoso e misterioso cozinheiro que lhes serve magníficos banquetes. Os laços de amizade estão de volta, é a gula como celebração da vida… e da morte.
Não é todo dia que se quer admirar um delicioso quadro de Picasso, ouvir uma crocante sinfonia de Beethoven, ler um suculento Fernando Pessoa ou assistir um apimentado Godard. Mas todos os dias se quer comer. A fome é o único desejo recorrente. A visão acaba, a audição acaba, o sexo, o poder, a juventude acabam. Mas a fome não, a fome continua.Diferente de todas as outras artes, a gastronomia reserva um desafio filosófico único: a plena apreciação de um objeto exige, invariavelmente, a destruição do objeto admirado. É possível admirar a beleza de um prato, observar a composição de suas cores, é possível se inebriar com o aroma dos ingredientes, mas uma comida apenas é contemplada por completo quando exterminada. E com a vida? Como a vida seria apreciada por completo?
Será que também pelo seu fim? Imagine saber com antecedência o dia e a hora de sua morte. O que se alteraria em sua dinâmica e em sua contemplação? Os significados, as relações, as intensidades, as prioridades. O que seria diferente?